domingo, 15 de maio de 2016

Jesus e a religião, e outras resposta a um protestante.

Resposta sobre religião, imagens e santos a um irmão protestante.

Ponto de partida: o significado da palavra religião

Isso posto, para começarmos a compreender a questão, comecemos pelo começo: o que é religião? E aqui não interessa
saber o que eu acho, nem o que você acha. Precisamos encontrar a definição culta e precisa da palavra, livre do que sugerem as imaginações particulares. Façamos então o mais simples e certo: consultemos o léxico. Nem o que você pensa nem o que eu suponho, mas sim o que este vocábulo realmente quer dizer em nosso idioma. Pois bem; no Michaelis, constam as seguintes definições para "religião": "Serviço ou culto a Deus; sentimento consciente de dependência ou submissão que liga a criatura humana ao Criador; culto externo ou interno prestado à divindade; Fé; Prática dos preceitos divinos ou revelados".
 
Ao reproduzir acima o texto do dicionário, quis destacar em negrito as assertivas mais importantes. Acabei por notar, porém, que a definição inteira é vital! Cada sinônimo dado à palavra ajuda sobremaneira a esclarecê
-la, e torna bem clara a sua compreensão. Em nosso idioma, religião simplesmente é:

 • O culto a Deus, seja externo (que se presta por meio dos nossos atos, das posturas que adotamos perante a vida, das nossas obras de caridade) ou interno (em nossa fé mais profunda, nossa espiritualidade, nossa devoção e santo amor a Deus e ao nosso próximo);

• O sentimento de dependência que nos liga ao Criador; em outras palavras, é reconhecer nossa pequenez, humildade e insuficiência diante da infinitude, supremacia e onipotência divinas, – o que significa, simplesmente, adoração;

• A fé. – Note-se bem que, na língua culta, fé e religião são sinônimos. Ter fé é ter religião, e quem não tem religião não tem fé. Mesmo que não se integre uma instituição religiosa ou se adote determinada doutrina formal, professar a fé em Deus já é uma forma de confissão religiosa;

• A prática dos preceitos divinos ou revelados. Em outras palavras: quem pratica a Vontade de Deus pratica a verdadeira religião.

Mais simples e mais certo do que isto, impossível. A confusão só pode partir de quem não procura realmente conhecer a verdade, ou de alguém que antepõe outros interesses pessoais ao desejo sincero de saber o que é verdadeiro e o que não é. O fato é que, se estamos falando de cristianismo, sim, Deus criou religião, e a verdadeira religião é fundamental para que nos aproximemos dEle.

 A origem da palavra

O vocábulo "religião", no sentido original, deriva do latim religio, religionis, que quer dizer “culto, prática religiosa, cerimônia, lei divina, santidade”. Existe alguma controvérsia quanto à etimologia da palavra, no sentido de se definir de qual verbo esse substantivo seria a forma nominal: se de religare ou de religere, – mas essa definição não é tão importante, já que os significados de um e de outro são muito próximos, e o sentido que para nós interessa permanece o mesmo.

Religare significa “religação": quer dizer "religar, reatar, ligar bem e justamente”1. A tese de que a palava deriva do religare vem desde Lactâncio (séc III/IV dC). No caso que ora estudamos, religare quer dizer religar ao Divino, a Deus. – O ser humano, por seu egoísmo, ignorância, fraquezas, apegos e desejos desordenados (pecado) encontra-se separado, desligado de seu Criador. Religião, assim, é o ato ou a prática de se retomar essa ligação perdida, sendo que, no contexto do cristianismo, Jesus veio nos trazer exatamente isto.

Na outra versão, a forma derivaria de relegere, que quer dizer “retornar, reler, rever, reaver, revisitar, retomar o que estava largado ou perdido”1. O filósofo Cícero (De Natura Deorum, de 45 aC), defendeu esta etimologia. Nesse caso, para os cristãos, religião se referiria ao ato de reler sempre a Palavra ou Verbo de Deus, ou, mais profundamente, de retornar incessantemente ao Caminho, que para nós, cristãos, é Cristo; ou, ainda, retomar nossa ligação (novamente) original com Deus. Religião, assim, é retomar a dimensão espiritual da vida, da qual as preocupações e cuidados mundanos tendem a nos afastar.

Agora, tendo compreendido bem do que exatamente estamos falando, retomamos o raciocínio abaixo, que assim poderemos perceber, com toda a clareza, é absolutamente desprovido de sentido:

 “E a prova de que a religião não salva ninguém é Jesus Cristo, que nasceu no meio de uma família judaica, e e sendo judeu, por tradição familiar, Jesus nos ensinou que o caminho da salvação está nele. O problema de católicos, protestantes, espíritas, etc, é que colocam a religião acima de Deus.”


Depois de entender o que significa religião, ao lermos a afirmação acima notamos como carece de qualquer razão: se Jesus ensinou que o Caminho da salvação está nEle, então nós precisamos ouvir o que Ele diz, seguir o que Ele ensinou, observar o seu exemplo. E fazer isso é, exatamente, praticar a religião. Então, essa separação entre Jesus e religião simplesmente não é possível. Vemos que a confusão se dá no fato de o leitor atribuir ao vocábulo "religião" um significado equivocado.
 
Vou dar alguns exemplos para ajudar a clarear ainda mais a questão: Jesus mandou a Igreja batizar aqueles que cressem e aderissem ao Evangelho. Celebrou e mandou celebrar a Eucaristia em sua memória. Mandou observar uma série de regras morais. Edificou sua Igreja sobre o Apóstolo Pedro, e conferiu aos seus Apóstolos a missão de conduzir esta mesma Igreja, dando-lhes autoridade para tanto. Mandou que confessássemos os nossos pecados, e decretou que os pecados que seus Apóstolos (e seus sucessores, evidentemente) não perdoassem, não seriam perdoados por Deus Pai. Pois bem, são exatamente estas e outras coisas semelhantes que a Igreja faz e ensina a fazer, obedecendo ao que ensinou Jesus Cristo. A todo este conjunto de coisas é que chamamos religião. Continuemos analisando o absurdo abaixo:

"se estudassem um pouco de história, descobririam que ela na verdade foi fundada pelo imperador romano Constantino, que queria apenas o poder, já que não conseguiu destruir os seguidores de Cristo, "juntou-se" a eles, com o único objetivo de ganhar poder..."

O que a História mostra, de fato, é que Constantino revogou a proibição do culto cristão no Império romano, através do Édito de Milão. Aliás, no tempo de Constantino, o Papa era Melcíades, 32º Sumo Pontífice da Igreja depois de Pedro, e estes são dados históricos mais do que comprovados. Assim, não há como se afirmar que Constantino seja o fundador da Igreja, já que ele apenas deu liberdade aos cristãos, – que obviamente já existiam desde o ano I da Era Cristã, – acabando com mais de dois séculos e meio de perseguição e martírios. Trata-se de uma questão extremamente simples, fácil de compreender e impossível de se negar. É preciso um altíssimo grau de alienação da realidade para aceitar a ideia de que tenha sido um imperador romano o fundador da Igreja, a partir do século IV! Nenhuma igreja protestante histórica (mais antigas) adota esse tipo de teoria da conspiração maluca para renegar a autoridade da Igreja Católica, pois tanto seus pastores quanto seus adeptos são pessoas de melhor formação. Se quiser entender melhor essa questão, por favor, leia
aqui, pois nós já esclarecemos este assunto, em detalhes.

Aliás, o pensamento mesmo se contradiz, afirmando que Constantino, não conseguindo vencer os cristãos, juntou-se a eles. Ora, mas não foi ele quem inventou a Igreja? Se ele se juntou à Igreja para ganhar poder, como você diz, então você admite que a Igreja já existia antes dele (?!).

Imagens na Igreja, mais uma vez...

Com relação à adoração de imagens, a Bíblia é bem clara com relação a isso, e mostra que Deus não admite adoração às imagens...

E aí vem você, depois de uma centena de ditos “evangélicos”, gritar mais uma vez que nós, católicos, "adoramos" imagens, e que imagem na Igreja é sinônimo de idolatria... Bem, nós já respondemos a essas acusações uma centena de vezes, também. Mas a paciência é uma grande virtude, na qual, eu confesso, sou falho. Logo, tentarei exercitá-la. Aí vamos nós...

Bíblia diz que Deus mesmo ordena a confecção de imagens, em diversas situações: manda esculpir e colocar querubins sobre a Arca da Aliança, o objeto mais sagrado do Antigo Testamento. Manda Moisés esculpir uma serpente de bronze, através da qual opera a cura no povo. Manda Salomão construir seu Templo repleto de imagens, com esculturas de anjos, de bois, de leões, de querubins de duas cabeças, de seres alados, etc, etc... E veja bem, são imagens de uso cultual, relacionadas diretamente ao culto divino. Está tudo na Bíblia!

Então, vou explicar de novo: idolatria não é usar imagem no culto; isso sempre aconteceu, desde o tempo de Moisés: o problema estava nas imagens dos ídolos, as imagens dos deuses pagãos. Idolatria seria adorar uma imagem como se fosse Deus ou um deus. Isso é tão óbvio! Você acha mesmo que nós, católicos, somos tão ignorantes a ponto de achar que imagens de gesso são deuses? Sabe, eu não acredito que você realmente pense isso. Acho que você só teve uma formação equivocada. Acho que você teve a cabeça feita por algum falso profeta que chamam de "pastor", e perdeu a capacidade de pensar por si mesmo. Se você tiver humildade suficiente para aprender coisas novas, leia
aqui o que já publicamos sobre esse tema tão manjado. Se quiser aprofundar, há ainda mais aqui.
 
Contestações "evangélicas": as mesmas de sempre

Quanto ao resto de sua objeções protestante, perdoe-me, mas é o mesmo blablabla de sempre: pedir aos santos, "adorar" Maria...

Para nós, católicos, os santos são nossos irmãos do Céu, como diz a Bíblia: “Aqui (no Céu) está a paciência dos santos; aqui estão os que guardam os Mandamentos de Deus e a Fé em Jesus” (Ap 14, 12), e a Igreja Católica nunca, jamais ensinou ninguém a "adorar" Maria ou qualquer dos santos. Se você me mostrar onde o Catecismo católico ou qualquer documento de qualquer Papa diz que devemos adorar Maria ou outro santo, eu lhe dou razão.

Você tem razão: não há motivo para "endeusar" a Virgem Maria, – pois cremos em um só Deus em Três Pessoas, – mas há motivos de sobra para honrá-la, amá-la e venerá-la: ela e somente ela abrigou Deus em seu ventre por nove meses, deu-lhe à luz, protegeu-o quando Ele se fez, por amor a cada um de nós, um bebê indefeso. O Sangue salvador que fluiu no Corpo do Cristo, e que foi derramado na cruz, é o mesmo Sangue que corria nas veias de Maria. Sim, porque Deus se fez homem por meio de Maria, foi de sua natureza humana que o Senhor fez seu próprio Corpo. Você já pensou nisso?

Você diz ainda que Maria não pode ser mãe de Deus, e eu lhe pergunto: Jesus é Deus? E quem é a mãe de Jesus? Está difícil demais acompanhar este raciocínio elementar?

Além de tudo, meus irmãos protestates, – cúmulo dos cúmulos, – me parece que vocês se veem como mais "sábios" do que o próprio Espírito Santo! Por quê? Bem, você diz que não podemos chamar Maria mãe de Deus, mas o Santo Espírito, que é DEUS, assim proclamou Maria, por meio de Isabel, como vemos no Evangelho segundo S. Lucas (1, 39-45): “Como posso merecer que a mãe do meu Senhor venha me visitar?"... – Sim, a Escritura afirma objetivamente que Isabel deu a Maria esse título por estar cheia do Espírito Santo (Lc 1, 41).

Por fim, sobre essa pequena coletânea de sofismas que você postou ao final do seu comentário, sobre a Igreja ter sido uma grande vilã da História, só posso lhe deixar uma dica de ouro: estude, estude e estude, e estude com interesse isento, imparcialmente. Não queira comprovar esta ou aquela opinião, mas busque antes e acima de tudo a verdade. Ao final deste post, deixo uma pequena lista de bons livros sobre o assunto, de bons autores, isentos, respeitados. São obras acadêmicas e outras de leitura mais fácil, mas todas para quem quer realmente aprender, e não se deixar afundar no poço sem fundo do preconceito e da alienação.

Para adiantar outros possíveis (e previsíveis) futuros questionamentos seus, deixo
aqui uma lista com as principais contestações "evangélicas" já respondidas neste site, assim fica mais fácil.

Finalizando, observo mais uma vez que é muito engraçado que você, que critica a religião, venha defender ferrenhamente uma religião específica, a religião do livro, a religião dos "evangélicos". Todas as afirmações que você fez, como já disse, evidentemente saíram da boca de algum "pastor" e se instalaram na sua mente, travestidas de verdades absolutas! Você comprou a religião do "pastor", e pior: ainda acha que não tem religião...

Deus os abençoe e lhes conceda discernimento, é o que peço em minhas orações.

 
Por: Henrique Sebastião
http://www.ofielcatolico.com.br/2001/05/jesus-e-religiao.html

_________
1. BIANCHI, Ugo. The Notion of "Religion" in Comparative Research. Roma: L'erma di Bretschneider, 1994, p. 63-73.
 _________

Bibliografia recomendada:
• GONZAGA, João Bernardino G. A Inquisição em seu Mundo. São Paulo: Saraiva, 1993.• PERNOUD, Régine. Luz Sobre a Idade Média. Sintra: Europa-América, 1981.

HEERS, Jacques. A Idade Média: uma Impostura. Lisboa: Asa, 1994.• GIMPEL, Jean. A Revolução Industrial da Idade Média. Sintra: Europa-América, 2001.

• WOODS Jr. Thomas E. Como a Igreja Católica Construiu a Civilização Ocidental, São Paulo: Quadrante, 2008.

• CAMMILIERI, Rino. La Vera Storia dell´Inquisizione, Piemme: Casale Monferrato, 2001.

• AYLLÓN, Fernando. El Tribunal de la Inquisición; De la leyenda a la historia. Lima, Fondo Editorial Del Congreso Del Perú, 1997.

• WALSH, William T. Personajes de la Inquisición. Madrid, Espasa-Calpe, S. A., 1963.

• FALBEL, Nachman. Heresias Medievais. São Paulo: Perspectiva S. A., 1977.

• Revista História Viva nº 32, especial Grandes Temas / "A Redescoberta da Idade Média", São Paulo: Duetto março/2011, p. 52.

Nenhum comentário:

Postar um comentário