sábado, 9 de novembro de 2013

O catolicismo no Brasil colonial.

Primeira Missa

No dia 26 de abril de 1500, num banco de coral na praia da Coroa Vermelha no litoral sul da Bahia, foi rezada uma missa de Páscoa, a primeira de tantas que desde então foram celebradas naquele que veio a tornar-se o maior país católico do mundo. Acompanhe os passos iniciais dos padres evangelizadores e as etapas das missões católicas no Brasil Colonial.
 
"E quando veio ao Evangelho, que nos erguemos todos em pé, com as mãos levantadas, eles (os índios) se levantaram conosco e alçaram as mãos, ficando assim, até ser acabado: e então tornaram-se a assentar como nós... e em tal maneira sossegados, que, certifico a Vossa Alteza, nos fez muita devoção." - Carta de Caminha a El-Rei, 1º de maio de 1500
 
A Primeira Missa e a conclusão de Caminha
 
Dias já faziam em que estavam os lusos ali entre idas à praia e voltas ao mar. Carregavam água, frutas e o lenho para os barcos, enquanto dois carpinteiros separavam um enorme tronco para a feitura da Cruz. Os índios, uns oitenta ou mais, tagarelas, estorvantes, arrodeavam os marinheiros em seus afazeres, olhando pasmos o efeito do fio do ferro na árvore. Da mata próxima vinham os barulhos da bicharada, o ruído forte dos papagaios, dos bugios, e de uma poucas pombas rolas. A missa mesmo, a primeira no Brasil, deu-se no Domingo de Páscoa, 26 de abril de 1500, quando afincaram a Cruz no chão macio de um banco de areia em Porto Seguro.
 
O Frei Henrique de Coimbra, um franciscano, oficiou-a todo aparamentado, enquanto a tripulação congregava-se na praia as voltas do altar. Tomavam posse daquela Ilha de Vera Cruz, em nome do rei de Portugal e da santa fé católica. Os nativos, dóceis, se portaram de tal modo que Caminha convenceu-se da fácil conversão deles no futuro. Um par de padres, dos bons, escreveu ele ao rei, bastava.
 
A decisão de vir ocupar o Brasil
 
Porém, não foi essa a decisão da Coroa. Demorou quase meio século para que um reduzido destacamento de jesuítas desembarcasse no Brasil para fins de catequese. As políticas anteriores de ocupação da nova terra ( o arrendamento ao consórcio de cristãos-novos de Fernão de Noronha, e, depois, a doação de capitanias), redundaram em fracasso. Foi o acirramento do combate teológico contra os protestantes, e as visitas das naus bretãs e flamengas atrás do pau-tinta, quem fez o rei abandonar a desatenção para com o Brasil. Tinha urgentemente que ocupar os pontos estratégicos da costa e por aqueles hereges à correr. Ou tomava conta de vez, ou perdia tudo.
 
Os primeiros seis missionários
 
A guerra econômica e religiosa das Europas, transferiu-se assim para o Brasil. Nos barcos de Tomé de Souza, o fundador de Salvador, vieram junto, em março de 1549, os soldados de Cristo, os homens-de-preto da recém fundada ordem de Santo Inácio de Loyola. Eram apenas quatro. O Padre Manoel da Nóbrega e o Padre Aspicuelta Navarro foram os mais famosos, depois, é claro, do Padre José de Anchieta que arribou mais tarde. A eles juntaram-se mais dois: Antônio Rodrigues, um ex-soldado mestre nos idiomas nativos, e Pêro Correia, um ricaço que decidira-se pelo hábito talar, e que, para Nóbrega, "era a melhor língua do Brasil". O trabalho era imenso. Evangelizar aquela massa de gentios, com mil falas, que se espalhava por aquele mundão todo, era tarefa de gigantes. Talvez nem o apostolo Paulo, no lugar deles, conseguisse.
 
Desentendeu-se Nóbrega, a seguir, com o teólogo Quirino Caxa, examinador dos Casos de Consciência da Bahia que dera o parecer, bem pouco cristão, de que um pai índio, em caso de penúria "da grande", podia vender seus filhos, e que o próprio nativo, se em idade para tanto, podia empenhar a si mesmo. Lançada as fundações do Colégio de Meninos de Salvador, o Padre Nóbrega, o cérebro estratégico da Companhia de Jesus no Brasil, não demorou em perceber, depois de uma visita que fez a São Vicente, bem mais ao sul, das vantagens da instalação de um centro de catequese no Planalto de Piratininga.
 
A Espada e a Cruz
 
Soubera lá, ao tentar demover o branco João Ramalho em deixar de ser um sultão em meio a uma serralho de índias, que o Rio Tietê era um intrometido. Enfiava-se por todo o sertão. Construindo o Colégio de São Paulo, batizado em janeiro de 1554, a cavaleiro daquele rio de caipiras, ele se entregaria à conquista espiritual da bacia do Paraná. Sonhou em chegar até ao Paraguai. Com um missal e um rosário em punho, seguido por um reduzido coral de curumins flautistas, enfiados em canoas, faria milagres. Estenderia um Império Teocrático até o sopé dos Andes. Dissuadiu-o Tomé de Souza, que não queria briga com os castelhanos. Virou-se então para a necessidade de vir ocupar-se a Guanabara (escreveu ao bispo em Salvador, dizendo-lhe do perigo de abandonar-se aquela área). Não sem antes que lhe lembrassem, citando-lhe as Constituições de 1556 da Companhia de Jesus, para que evitassem ter escravos, que assumissem a pobreza cristã.
 
Logo, Estácio de Sá, em campanha contra os franceses no Rio de Janeiro, chamou-o. Queria o padre Nóbrega e seus orfeus-mirins para que, com seus trinados, exorcizassem a presença calvinista da Baía da Guanabara e fizessem sossegar os Tamoios. Apresentou-se o jesuíta a ele em 1565. A batina e a couraça, a cruz e a espada, aliadas, garantiram que São Sebastião do Rio de Janeiro ficasse com os lusitanos.
 
Dada a pouca esperança de muitos portugueses em ver prosperar aquela capitania, muitos deram a desandar, a desertar. Queriam voltar para a terrinha, para Lisboa. Ai deles! Nobrega virou fera. Deus os mandar ali, e eles tinham que ficar. Nada de frouxuras. Chamaram-no de tirano, disseram-se "cativos do faraó", mas se aquietaram.
 
Catequese dos índios na História do Brasil

Poe Carlos Sodré Lanna
 
Transcorria o ano de 1556. Dom Pero Fernandes Sardinha ­nosso primeiro bispo - tomava a nau Nossa Senhora da Ajuda, acompanhado de eclesiásticos, pessoas da sociedade e famílias inteiras rumo a Portugal.
 
Um acidente fatal a fez soçobrar pouco depois de zarpar de Salvador. Os que escaparam ao naufrágio - e foram muitos - acabaram capturados e devorados pelos ferozes Índios caetés, na margem esquerda do rio São Miguel, ainda hoje indicada graças à crença popular.
 
Eis um acontecimento característico do estado dos Índios brasileiros por ocasião da chegada dos nossos primeiros colonizadores e missionários.
 
Para darmos uma idéia da mudança ocasionada pelo influxo do Cristianismo e da civilização, apresentaremos, neste primeiro artigo de uma série de três, um quadro geral da situação em que se encontravam os aborígines na época do descobrimento do Brasil.
 
Nomadismo e promiscuidade
 
Talvez a maior descoberta dos portugueses ao desembarcarem em nossas terras tenha sido os próprios Índios, um tipo humano ainda não conhecido pelos lusos em nenhuma parte do mundo. A única ciência dos Indígenas era a floresta. O objetivo de suas vidas era comer, beber, caçar, combater e matar ...
 
As aldeias que construíram - as tabas ­duravam no máximo quatro anos: as madeiras apodreciam, as palmas dos tetos de suas ocas já não os cobriam e toda a caça da redondeza estava exterminada.
 
Se alguma tribo se dedicava precariamente à agricultura, as terras cultiváveis estavam cansadas, o que obrigava os silvícolas a se mudarem de local. Além de predadores da natureza, nossos Índios, com seus costumes nômades, jamais conheceram qualquer tipo de desenvolvimento.
 
Os laços sociais que os uniam eram de tal maneira frouxos que essas pequenas tribos se fracionavam cada dia mais. As constantes guerras de extermínio entre elas constituíam motivo para que se debilitassem e diminuíssem em número.
 
Nessas pobres almas predominava o instinto de vingança. Iniciadas as rixas que eram transmitidas de pais para filhos, não se poderia esperar nenhum sentimento de abnegação em favor do interesse comum e tampouco da posteridade.
 
Ao contrário de certas visões idílicas que alguns autores indigenistas procuram dar à vida tribal, ela se caracteriza pela mais completa promiscuidade, causadora de todas as espécies de doenças e vícios morais.
 
Vários cronistas da época relatam que os Índios, antes da conversão, moravam em casas compridas - as ocas - cuja superfície era de trezentos ou quatrocentos palmos por cinqüenta de largura; suas paredes eram de palha e o teto recoberto de folhas de palmeiras. Dentro delas viviam esparramados indistintamente cerca de cem a duzentos silvícolas. Entrando na oca, via-se a todos e tudo quanto nela se encontrava. Uns cantavam, outros riam, outros choravam, alguns preparavam farinha, outros o cauim etc. Havia pequenos fogos por todos os lados dando uma aparência de labirinto ou de um pequeno inferno.
 
Essas tabas eram escuras, mal-cheirosas e esfumaçadas. À guisa de camas, os infelizes nativos usavam uma espécie de rede que exalava um odor horripilante, pois eles eram tão preguiçosos que nem se levantavam para satisfazer suas necessidades naturais.
 
Índios canibais
 
Eram seres humanos inteiramente rudimentares, ferozes, astutos, mentirosos e traiçoeiros. E, além do mais, eram canibais.
 
As cerimônias de matanças públicas serviam de pretexto para festas e ajuntamentos. Daí a denominação de "antropofagia ritual" que lhes deram. Os aborígines comiam seus inimigos por vingança. Suas expedições guerreiras tinham também como fim proverem-se de carne humana.
 
Durante os combates, os índios visavam sobretudo à captura de prisioneiros. Após uma luta preliminar, os guerreiros de ambos os lados precipitavam-se uns contra os outros, esforçando-se para desarmar o adversário e aprisioná-lo vivo. Os mortos e feridos no campo de batalha eram dizimados e devorados imediatamente, levando-se também diversas partes assadas para casa. A expedição vitoriosa fazia uma entrada triunfal em todas as tabas aliadas, ao longo do caminho. Ao chegar à aldeia de origem, as tropas obrigavam o prisioneiro a gritar: eu, vossa comida, cheguei!
 
Nenhum deles podia escapar ao sacrifício ritual para o qual era destinado. Caso adoecesse, os indígenas levavam-no mata adentro e partiam-lhe o crânio, deixando o cadáver insepulto. A duração do cativeiro variava muito, pois os
velhos eram mortos sempre no retorno da expedição, enquanto os jovens poderiam manter-se cativos por vários meses, até anos.
 
Marcada a data da execução, todos os vizinhos e aliados eram convidados a tomar parte no festim. Passavam a noite precedente, num simulacro de vigília, a dançar, cantar e beber. Logo ao alvorecer, várias mulheres conduziam a vítima amarrada pela cintura até a praça da execução, no centro da aldeia, em meio a grande alvoroço. Aparecia então, no pátio, o carrasco dançando com um enorme tacape nas mãos, e, aproximando-se do prisioneiro, o brandia com toda força, quebrando-lhe a cabeça.
 
Mal o mísero massacrado caísse morto, velhas índias precipitavam-se sobre ele para recolher em uma cuia o sangue e os miolos que eram engolidos ainda quentes. Em seguida, o cadáver era assado como se fosse um porco e depois esquartejado, levando-se então os pedaços às cabanas em meio a gritos de alegria. Os selvagens acreditavam que, comendo a carne do inimigo, apropriavam-se de suas qualidades e manifestavam sua superioridade sobre ele.
 
Antropofagia doméstica
 
Algumas tribos comiam por culto membros de sua família que faleciam, dando-lhes, como pensavam, um digno sepultamento em seus próprios estômagos.
 
Nas tribos que praticavam a antropofagia era freqüente encontrar esse canibalismo doméstico, mágico ou participativo. Ele procede da crença de que, pela ingestão das carnes de um indivíduo, dá-se a mais íntima união possível com ele, e por conseguinte, a participação em suas qualidades: coragem, vigor, destreza etc. Daí os banquetes sagrados em que eram comidos, em festividades solenes, os personagens tidos como superiores: o cacique, o pajé, os guerreiros ou heróis, freqüentemente pessoas da própria tribo.
 
Assim, a fim de se revestirem das qualidades desejadas de seus antepassados, surgiu em várias tribos o costume de ingerir-lhes, em rituais fúnebres, as cinzas com bebidas especiais.
 
Um mês após o funeral do familiar, desenterravam seu cadáver, já em adiantadíssimo estado de putrefação, e o colocavam em uma grande panela sobre o fogo, até que lhe extinguissem as partes moles. Os odores fétidos exalados durante o ato completavam aquele ritual macabro. Quando os ossos ficavam carbonizados, eram triturados e reduzidos a pó. Este, por sua vez, era colocado em grandes cuias de madeira cheias de bebidas. Todo o grupo presente bebia então esta mistura até a última gota, crendo que as virtudes do morto haviam se transmitido a todas as pessoas que a ingeriam.
 
Fundação dos aldeamentos
 
Foi esse o sinistro panorama encontrado pelos primeiros missionários que para cá vieram, com a intenção de iniciar a catequese desses silvícolas e implantar a Civilização Cristã em nossa pátria.
 
Segundo estimativas geralmente aceitas, na época do Descobrimento, o Brasil contaria com cerca de cinco milhões de índios. O grande mérito de Portugal foi transformar a catequese na base de sua obra colonizadora. "Contudo, o melhor que dela se pode tirar parece-me que será salvar esta gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar" , escreveu Pero Vaz de Caminha a el-Rei de Portugal, Dom Manuel, narrando a descoberta da Terra de Vera Cruz.
 
Os maiores entraves para sua conversão foram: a antropofagia, a poligamia, as bebedeiras, o nomadismo intermitente, as guerras entre tribos vizinhas e a inconstância nos propósitos.
 
Se os missionários se contentassem tão-só em percorrer as aldeias dos nativos, além de todos os tipos de riscos que enfrentariam, o resultado seria precário. O que eles ensinassem em um mês, por falta de exemplo ou de exercício, perderiam no outro. Com o nomadismo intermitente dos índios, ao voltarem os missionários a uma tribo que haviam catequizado pouco antes, em vez dela encontrariam cinzas.
 
Era necessário o mais depressa possível fixar os indígenas ao solo, afastando os já batizados da influência dos que permaneciam pagãos. De outra maneira, não seriam extirpadas as indecisões nem a volta aos costumes antigos.
 
A catequese dos índios seria uma quimera enquanto não se organizassem os aldeamentos, com regime próprio e autoridade. As primeiras tentativas de formação das aldeias indígenas ocorreram na Bahia. Elas foram a modalidade mais eficaz e original de colonização aplicada no Brasil, primeira semente das célebres reduções jesuítas.
 
Para ser eficaz e completa, a atividade dos missionários precisava ser apoiada pelas autoridades públicas. O terceiro Governador Geral do Brasil, Mem de Sá (1558­1572), concedeu todo apoio moral e material aos primeiros missionários jesuítas, comandados pelo padre Manoel da Nóbrega.
 
Sob a influência da milícia de Santo Inácio, os Governadores-Gerais deram a tais aldeamentos regalias quase municipais. Com efeito, tinham eles uma legislação especial que regulamentava os bens dos índios, sua separação em relação aos portugueses, o comércio entre eles e o regime de trabalho, baseado nas instituições portuguesas.
Começou desse modo a grande obra de catequese junto aos silvícolas brasileiros, cujo desenrolar trataremos no próximo artigo.
 
Índios brasileiros: genocídio ou assimilação?
 
Ao contrário do que trombeteiam ecologistas e indigenistas fanáticos, bem como certos historiadores de orientação marxista, a maioria dos indígenas brasileiros não foi chacinada na época dita colonial, mas assimilada ao resto da população
 
Por Armando Alexandre dos Santos
 
Uma alegação freqüentemente feita contra a obra civilizadora lusa no Brasil diz respeito ao pretenso massacre e extermínio das nações indígenas, que teria sido perpetrado pelos brancos europeus. Este é, aliás, um tema glosado ad nauseam pelo ecologismo obsessivo e irritante de nossos dias, bem como por certo indigenismo.
 
A se crer nos adeptos dessas correntes, bem como em autores marxistas ou pró-marxistas já um tanto ultrapassados, um dos resultados da ação de Portugal no Brasil, entre 1500 e 1822, teria sido o genocídio de populações indígenas inteiras.
 
Autores há que afirmam, com ar de verdade demonstrada, que os indígenas seriam, quando do Descobrimento, 6 ou 10 milhões. E como hoje os índios não passam de poucas centenas de milhares, a conclusão apressada é que os portugueses teriam pura e simplesmente chacinado nações inteiras, ou diretamente, em guerras, ou indiretamente, pela transmissão de doenças desconhecidas dos índios, pela eliminação dos ambientes próprios à vida indígena, etc.
 
Na realidade, não há possibilidade científica séria de se avaliar quantos eram os aborígines brasileiros no Ano da Graça de 1500, quando aqui aportaram as caravelas cabralinas. Pode-se lançar ao ar alguma cifra, arbitrariamente, mas não se pode pretender que tenha base científica.
 
Por outro lado, foi enorme a miscigenação ocorrida entre os primeiros povoadores lusos e as raças indígenas. Essa miscigenação muitas vezes deu-se dentro dos laços sagrados do Matrimônio. Inúmeros portugueses, até mesmo fidalgos de elevada condição, consorciaram-se no Brasil com índias de tribos amigas. Qualquer genealogista brasileiro registra incontáveis casos desses.
 
Esses casamentos -- ou essas uniões naturais -- eram habitualmente muito fecundos, deles resultando uma raça mestiça forte e dura, de grande eugenia, que somava as qualidades de uma e outra etnias.
 
Os bandeirantes paulistas, que já foram chamados Raça de Gigantes, eram mamelucos que não se envergonhavam de sua origem indígena. Ainda hoje, os paulistas chamados "de quatrocentos anos" se orgulham de descender de um João Ramalho e de sua mulher Bartira, de um Piquerobi, de uma Mécia-Assu.
 
Um desses paulistas "de quatrocentos anos" contou-me o caso de certo conde francês, que casou em São Paulo, na década de 1950, com uma moça oriunda remotamente de Tibiriçá -- o mesmo cacique guaianá que jaz sepultado na cripta da Catedral de São Paulo e do qual o Beato José de Anchieta fez grandes elogios (1). Esse conde fez questão de levar para seu castelo, na Normandia, um quadro a óleo que representava (com fidelidade mais do que discutível, evidentemente) o cacique do qual seus remotos descendentes franceses se orgulhariam.
 
Para citar outro exemplo, desta vez do Nordeste brasileiro, lembre-se o caso do célebre Adão Pernambucano, Jerônimo de Albuquerque, cunhado de Duarte Coelho Pereira, primeiro donatário da Capitania de Pernambuco e parente próximo do célebre Afonso de Albuquerque. O cognome Adão Pernambucano lhe veio do fato de ter deixado nada menos que trinta e quatro filhos, entre legítimos e ilegítimos. Vivendo algum tempo prisioneiro de uma tribo indígena, Jerônimo teve de uma índia, filha do cacique Uirá-Ubi (arco verde, no idioma nativo), oito filhos que foram reconhecidos legítimos e nobres pelo Rei D. Sebastião, em 1561, e deixaram vastíssima descendência. Essa índia, batizada com o nome de Da. Maria do Espírito Santo Arcoverde de Albuquerque, e, segundo alguns, regularmente casada com o nobre português, foi mãe de Jerônimo de Albuquerque Maranhão, o cabo de guerra que em 1614 reconquistou o Maranhão aos franceses.
 
Outra filha do Adão Pernambucano e da Princesa do Arco Verde (como era a índia geralmente chamada) foi Da. Catarina de Albuquerque, que casou com Filipe Cavalcanti, fidalgo florentino a serviço da Coroa portuguesa. O casal teve onze filhos, e deles descendem os Cavalcanti e os Cavalcante, tão numerosos em todo o Nordeste brasileiro. Deles ainda descendia, em linha direta, o primeiro Cardeal brasileiro e sul-americano, Dom Joaquim Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti.
 
Houve, sem dúvida, no passado, guerras sangrentas e cruéis entre europeus e índios. Também houve (e ainda há) guerras sangrentas e cruéis entre as próprias tribos, dizimando-se rotineiramente entre si. Mas pode-se com segurança afirmar que a imensa maioria do contingente indígena não foi eliminada, como pretendem pseudo-historiadores, mas foi assimilada racial e culturalmente.
 
A se crer em muitos órgãos da mídia internacional, o Brasil atual estaria completando o genocídio iniciado por Cabral e seus companheiros, e dentro de muito pouco tempo terão desaparecido os últimos verdadeiros índios.
 
A esses falsos alarmes da mídia fazem eco "ecologistas" frenéticos, Bispos e Sacerdotes comprometidos com certa Teologia da Libertação (novamente condenada por João Paulo II durante sua última viagem ao Brasil), bem como os inimigos da Amazônia brasileira que pretendem uma internacionalização dela etc. Entretanto, a realidade é bem diversa.
 
Segundo pesquisa oficial efetuada pela FUNAI -- Fundação Nacional do ?ndio, na década de 80 a população global de índios não diminuiu, mas pelo contrário aumentou no Brasil, em cerca de 25 %. Algumas tribos tiveram um crescimento consideravelmente mais acentuado do que a média dos brancos. Os índios Paracanãs, por exemplo, que vivem no sul do Estado do Pará, tiveram um aumento de 9,9 % ao ano, enquanto a média de aumento da população branca esteve na ordem de 2,9 %. Os índios Xavantes dobraram seu número ao longo da década. E os Gaviões se duplicaram em apenas cindo anos, entre 1985 e 1990. Esses dados foram publicados pela insuspeita revista "Veja" (2), a de maior circulação no País.
_________________________________
Notas:
(1) "Foi ele o nosso principal grande amigo e protetor, não só benfeitor, mas ainda fundador e conservador da casa de Piratininga e das nossas vidas", escreveu, a respeito de Tibiriçá, o Beato Anchieta. E, em outro local: "Inimigo dos seus próprios irmãos e parentes por amor de Deus e de sua Igreja" (apud Aureliano Leite, História da Civilização Paulista, Edição Saraiva, São Paulo, 1954, p. 33). Sobre a luzida descendência do cacique, ver Antonio Pompêo de Camargo, "Tibiriçá, Patriarca da raça bandeirante", in "Revista do Instituto de Estudos Genealogicos", São Paulo, 1937, nº 2, pp. 284-290.
(2) 11-4-1990.
 
Por que a Igreja apoiava a escravidão indígena e africana?

Por: Juberto Santos
            
Eis um importante assunto que até hoje é comentado em salas de aula, roda de professores, dentro das igrejas e ainda é muito pesquisado por historiadores e demais cientistas sociais, políticos e teólogos. Peço encarecidamente que o leitor NÃO faça uma análise anacrônica, pejorativa ou preconceituosa sobre o tema, pois não podemos estudar os fatos históricos fora dos contextos de suas épocas.

Atualmente a Igreja lamenta tais procedimentos, entendimentos, pois assim como toda a sociedade, aprendeu com seus erros, falhas, equívocos, além de olhar para frente e, melhorar e renovar suas formas de pensar.

Tendo isso em mente, vamos a uma breve explicação. Ressalto que esse texto é uma síntese visando informar e esclarecer possíveis dúvidas sobre o tema, além de cativar o leitor a pesquisar mais profundamente todos os pontos citados ao longo do mesmo, ok? Existem inúmeros textos que podem ajudar a entender o período, os quais estarei citando ao final.

Recortarei esse tema para a Conquista e Colonização Ibérica na América. Portugal e Espanha, países católicos, trouxeram junto com os navios e desbravadores, os sacerdotes, os quais tinham a missão de expandir a fé para essas novas terras. Encontraram sociedades nativas com costumes totalmente diversos, ou como diria o antropólogo Lévi Strauss, os europeus encontraram “outra humanidade”. Na colonização espanhola viu-se uma verdadeira “Guerra de Imagens” e a condenação das práticas religiosas dos nativos sendo colocada como “idolatrias” ou “demoníacas”. Realmente essa colonização foi mais dura, observando essas questões, do que a portuguesa.

A sociedade européia, nesse período, teve alguns problemas na forma de lidar com o elemento nativo americano. Num primeiro momento muitos achavam que eles não teriam alma. Depois entenderam que eles eram pessoas puras e necessitavam receber o Evangelho, outros ainda pensavam que deveriam ser tratados como os “mouros” (muçulmanos africanos / árabes). E a Igreja de Roma também precisava lidar com essa situação. Muitos debates foram vistos, livros foram escritos sobre o nativo – “índio”.

A escravidão dos africanos já era uma prática pelas próprias tribos do continente e quando os portugueses passaram a avançar pelo litoral da África, muitas tribos começaram a vender esses escravos, fato que era muito bem visto pelos conquistadores. Com a chegada à América, esses escravos serão a base da mão-de-obra da América Portuguesa.

O projeto colonial português se afirmava desenvolvendo duas formas de intervenção drásticas para a sobrevivência dos povos indígenas: usurpação de suas terras e exploração da sua força de trabalho. Na realidade, os primeiros escravos do Brasil foram os índios, também chamados, na documentação oficial, de “negros da terra” ou “gentío da terra”.

De início, recorreu-se aos indígenas, com o escambo, contudo, os portugueses queriam o trabalho em tempo integral e, para isso, necessitou escravizar os nativos. Eram usados como força de trabalho em tempo de guerra e em tempo de paz: soldados contra o invasor não português e trabalhadores na construção de obras públicas, engenhos, fortalezas, nas plantações do colonizador.

A chamada Igreja Colonial foi baseada em situações controversas. Alguns historiadores afirmam que estudar esse período é algo muito complexo, pois essa sociedade era muito diferente das demais e também foi única.

Os negros foram introduzidos no Brasil a fim de atender às necessidades de mão-de-obra e às atividades mercantis (tráfico negreiro). O comércio de escravos africanos para o Brasil teve início nos primeiros tempos da colonização. Na África os negros eram trocados por aguardentes de cana, fumo, facões, tecidos, espelhos, etc. Os africanos que vieram para o Brasil pertenciam a uma grande variedade de etnias.

Desde o século XVI o Cristianismo tem sido a principal religião do Brasil, predominando a Igreja Católica Apostólica Romana. O catolicismo no Brasil foi trazido por missionários que acompanharam os exploradores e colonizadores portugueses nas terras do Brasil. O catolicismo possui grande presença social, política e na cultura do Brasil.

A Igreja e o Estado possuíam funções e posições muito próximas, como uma forte aliança do tipo “Trono e Altar”, “Cruz e Espada”, entende? Atualmente não vemos essa forte ligação, todavia, nos séculos XV ao XVIII, por exemplo, era um fato muito comum. A Igreja sempre esteve ligada a Coroa portuguesa desde a Idade Média (476-1453) e vemos essa participação também na colonização da América Portuguesa. Os reis exerciam o “Padroado”, ou seja, com a autorização papal eles nomeavam as autoridades religiosas e os religiosos passavam a ser “funcionários” do Estado.

ATENÇÃO!! Não podemos esquecer que nesse momento está o correndo paralelamente a Reforma Protestante, iniciada por Martinho Lutero em 1517, e a Igreja de Roma estava com os olhos voltados para evitar que ela se alastrasse por toda a Europa. Assim vemos essa concessão papal visando um auxílio para a evangelização no Novo Mundo. Com isso, os estados controlavam a atividade eclesiástica da colônia por meio do padroado, assim arcava com o sustento da Igreja colonial e ganhava a obediência e o reconhecimento da Igreja de Roma. Além disso, o Estado nomeava os bispos e párocos e concedia licenças para a construção de novas igrejas, ajudando financeiramente todo este processo.

A atuação da Cia de Jesus na América se dará na catequese dos indígenas, utilizando o teatro, a difusão das imagens visando a conversão e o controle social. São contra a escravidão indígena, visam salvar suas almas, modificar seus hábitos e costumes que não condiziam com o Cristianismo.

Os nativos nunca tiveram o contato anterior com o Cristianismo, mas, como já foi mencionado, ainda existia um debate muito visto: se o nativo teria alma ou não.

Em 1549, seis jesuítas da Companhia de Jesus acompanharam o Governador-Geral Tomé de Souza, estes eram chefiados pelo Padre Manoel de Nóbrega, em 1580 os carmelitas descalços chegaram ao Brasil e em 1581 tiveram início às missões dos beneditinos. Durante o século XVI e XVII, o governo português, representado pelos governadores-gerais, buscara o equilíbrio entre o governo central e a Igreja Católica, com o intuito de diminuir e administrar os conflitos existentes entre os missionários, os colonos e os índios.

Eis a famosa pergunta: Por que a Igreja apoiou a escravidão africana?

O contato dos africanos com o Cristianismo não começa nesse período.

Vemos que, ao longo da Idade Média (476-1453), esse contato com os mouros (árabes muçulmanos) no processo re reconquista da península ibérica desde o ano de 711. Vemos também na ação portuguesa em realizar o “périplo africano” nas Grandes Navegações, aonde o Cristianismo se propagou pela costa da África. A religião nativa era contrária aos princípios cristãos, a grande maioria não aceitou o Evangelho, além da religião Islâmica já estar bem propagada e por também não aceitar tais princípios dos cristãos. Podemos entender a postura da Igreja frente a essa problemática por vários ângulos diferentes, pois são muitas as explicações que são dadas. Eis uma explicação:

Assim, a Igreja passou a ver esses que se recusaram a Fé, como descendentes de Cam, personagem bíblico, um dos filhos de Noé, que foi amaldiçoado pelo próprio pai. Tal fato é narrado no livro de Gênesis, no Antigo Testamento: “Maldito seja Canaã, disse ele; que ele seja o último dos escravos de seus irmãos!” (livro do Gênesis 9, 25).

Os mouros foram assim combatidos ao longo de toda a Idade Média. Eram chamados também de infiéis. Os africanos assumem essa conformação e são vistos como escravos, assim como Cam. Contudo, o trabalho forçado garantiria a libertação deles do pecado do paganismo, para serem merecedores da graça eterna, da salvação na outra vida.

Com a chegada à América, os nativos também passariam por esse crivo dos europeus. Por acreditarem que não tinham alma podiam ser tratados como “coisa”, logo eram inferiores e poderiam ser escravizados, explorados. Outros foram tratados da mesma forma que os africanos, pois algumas tribos eram canibais ou realizavam sacrifícios humanos, por exemplo. Surgia assim a chamada Guerra Justa. Os nativos que ficavam nas Missões (vilas administradas por jesuítas) eram evangelizados e não podiam ser escravizados. Porém, esses fatos não era algo perfeitamente concluso, pois gerava muitos debates por religiosos e autoridades na época.

Com o a chegada do Pe. Manuel da Nóbrega (1517-1570), junto com Tomé de Souza; José de Anchieta (1534-1597), em 1553; o padre Antônio Vieira (1608–1697); dentre muitos outros, temos a forte presença religiosa. Eles foram fundamentais para a ampliação da cristianização dos nativos na América Portuguesa, através de seus sermões que valorizavam a vida humana, atacavam os maus tratos dos senhores, assinalavam que os escravos precisavam trabalhar arduamente para purificar seus corpos visando a salvação... Os mesmos padres que apoiavam os senhores, em outros momentos puxavam suas orelhas devido aos maus tratos com os escravos e por privarem eles dos sacramentos da igreja. Em outros textos, os jesuítas criticam os escravos que são preguiçosos, que desafiam os senhores, pois deveriam ser “bons escravos”;

Vemos uma igreja complexa, assim como a sociedade daquele período; não há como separar a Igreja do restante da sociedade, pois ela é regida pelos homens; ela estava dentro de um pensamento típico dos séculos XIV, XV, XVI, XVII, XVIII..., logo não podemos analisar essa Igreja segundo os parâmetros do século XXI; precisamos entender aquele processo histórico, as suas tensões, sua complexidade dentro do seu próprio contexto e imaginário.

Bem, a Igreja de Roma partia do princípio de que detinha a verdade e, por isso, obrigava pela força que todos os demais estivessem de acordo com suas idéias.

Pedidos de Perdão de João Paulo II

João Paulo II, em março de 2000, lançava um documento de 90 páginas, agrupando as incorreções em blocos que abrangem praticamente toda a história da Igreja, pecados contra os direitos dos povos e o respeito à diversidade cultural e religiosa, ou seja, a evangelização forçada colocada a serviço da colonização de povos dominados, além de citar a Inquisição, as Cruzadas, ataques aos judeus, indígenas, árabes, dentre outros. Em 2004, novamente pedia perdão pelos "erros cometidos a serviço da verdade por meio do uso de métodos que não têm relação com a palavra do Senhor" (Inquisição).

Ele pediu perdão pelos pecados cometidos pela Igreja Católica durante os últimos dois mil anos, incluindo o tratamento dispensado a pessoas de outras religiões. O Pontífice citou o uso da violência "a serviço da fé" e a hostilidade contra os praticantes de outras religiões

"Estamos pedindo perdão a Deus pelas divisões entre cristãos, pelo uso da violência que, por vezes, praticamente a serviço da fé e por atitude de desconfiança e hostilidade assumidas contra os praticantes de outras religiões", disse o Santo Padre; e humildemente também pediu perdão a Deus pelas "responsabilidades dos cristãos nos males de hoje". O Sumo Pontífice pediu ainda perdão a Deus pelos "erros cometidos por outros contra cristãos. O Papa descreveu a sua ação como uma tentativa para "purificar a memória" de uma triste história de ódio e rivalidades.

Nenhum comentário:

Postar um comentário