quinta-feira, 21 de novembro de 2013

O essencial do cristianismo.

Por Dom Henrique http://visaocristadomhenrique.blogspot.com.br

Meu caro Leitor, estive imaginando uma catequese sobre a essência do cristianismo, feita de um modo acessível... Quantos somos cristãos, mas não temos uma ideia clara sobre qual é o sentido mesmo, mais profundo e definitivo, da fé cristã. Eis, portanto, nas postagens seguintes, uma proposta bem simples de explicar algo central da nossa fé! A linguagem é simples, mas o conteúdo é profundo! Não é meu; é a fé da Igreja, a fé dos Apóstolos, o desígnio amoroso de Deus! Lá vai:

Imaginemos um Juliano, curioso, sincero, crítico, sedento...

- Diga-me: Em que consiste o cristianismo? Qual a sua essência? Afinal, por que ser cristão? Por que EU deveria tornar-me cristão? Diga-me isto sem muito arroxeio! Mostre-me que o cristianismo é necessário, é indispensável! Convença-me a ser cristão!

E pensemos no que responderia um Teófilo, cristão do essencial, daqueles que conhecem em profundidade a fé cristã, daqueles que vão na mira, direto ao que realmente importa:

- Primeiro que tudo, é preciso compreender isto: O cristianismo se considera uma religião revelada. Não é fruto de uma pensamento filosófico ou religioso sobre a vida. Sua doutrina não é uma descoberta dos homens, de um sábio que teve uma intuição superior...

Os cristãos acreditam que Deus Se revelou, falou homem; disse o significado do mundo, da humanidade, sua finalidade e o que fazer para chegar a essa finalidade...

Os cristãos acreditam que não chegar a essa finalidade é frustrar-se, é não saciar o coração, é não encontrar o sentido último e fundamental da existência, é esvaziar-se neste mundo e perder-se para a eternidade...

Mas, vou logo avisando: não se pode ser cristão sem se crer que Deus falou, que disse a Verdade sobre o mundo, sobre o homem, sobre a vida e sobre a morte, sobre o certo e o errado, o bem e o mal, o aqui e o Além... Quem não crê nisto, não pode ser cristão.

Juliano: Mas, que Deus é esse?

Teófilo: Aquele dos judeus. Os cristãos cremos que o Deus dos judeus é o Deus verdadeiro. Escolheu aquele povo, educou-lhe pelos seus profetas, guiou-os pelo seus pastores (juízes, reis, profetas, sacerdotes, escribas...).

Mas, tudo isto era preparação, figura, uma forma de profecia feita história viva.

Juliano: E para que isto tudo? Parece um jogo de esconde-esconde, uma brincadeira... Um Deus sério perderia tempo assim?

Teófilo: Você me perguntou pelo essencial. E vou direto a ele! Por agora basta dizer que o que Deus queria com tudo isto era levar o homem ao seu destino.

Juliano: E qual é esse destino?

Teófilo: Deus criou tudo e nos criou para uma Plenitude, para participar de modo pleno e total da Sua própria Vida.

Então, toda a preparação do Antigo Povo e todo o cristianismo têm este sentido: Deus quer dar ao mundo a Plenitude. Ele criou tudo bom, tudo perfeito, mas não tudo pleno! Aliás, nada na criação é pleno! Tudo se move, tudo está a caminho: não só as águas que correm para o mar, não só o vento que sopra inquieto, não só o coração humano que não tem sossego! Tudo, tudo absolutamente caminha, se move, dirige-se a um Ponto Final! E esse Ponto não é o nada, mas uma Plenitude, a participação na Vida mesma de Deus. Para isso Ele criou tudo, por isso a saudade que tudo tem de “uma Coisa”, de “um Algo”. Tudo neste mundo parece tão incompleto, tão provisório, tão a caminho de “Algo mais”... Até o vulcão zangado e o tsunami furioso têm saudade...

E aqui está um dado essencial para compreender o cristianismo: a Plenitude não está na criatura, mas no Criador! A criatura não se realiza em si própria, mas somente recebendo a Vida divina, a Vida plena do Eterno, a Vida eterna do Deus vivificante! Nós, cristãos, chamamos essa comunhão com o Criador, essa Plenitude de “Salvação”!

Ser salvo é ser pleno da Plenitude de Deus; ser salvo é ser criatura plena, é entrar nesta explosão de Vida, de Alegria, de Gozo, de Saciedade, de Felicidade que somente Deus tem e somente Deus pode dar! É por isso que os Livros Santos falam em banquete, bodas, vinhos finos e a carnes gordas, alegria... Tudo isto são figuras para dizer o indizível, para dizer algo dessa Plenitude!

Juliano: Eu pensava que salvação era ter o perdão dos pecados... Os cristãos falam tanto nisto!

Teófilo: Não! É muito mais que isto! Pensar na salvação simplesmente como remissão dos pecados é muito, mas muito estreito! Salvação é comunhão e participação na Plenitude de Deus! É isto que chamamos Céu, Reino de Deus, Vida Eterna...

Agora, como cremos que a humanidade pecou, para entrar nessa Plenitude de que falei, realmente tornou-se necessário o perdão dos pecados. A remissão dos pecados não é, em si, a salvação, mas tornou-se a porta, a condição necessária para a Salvação, isto é, para a comunhão com Deus. Assim, esse perdão é apenas o início, a porta para entrar na Plenitude, na Salvação. Salvação de que coisa? Explico logo: de ficar incompleto, no meio do caminho, longe daquilo para que fomos criados... Sem receber a Vida plena que Deus nos preparou desde o princípio, esta vida nossa é incompleta... Seríamos eternos insatisfeitos, saudosos do nosso modelo original, saudosos de nós mesmos!

Juliano: Até agora compreendi. Mas, não é isto que os cristãos dizem geralmente...

Teófilo: Deficiência na nossa formação! Uma das maiores misérias nossas, dos cristãos, é achar que sabemos direitinho a nossa fé, quando estamos bem longe disso, daquilo que nossos primeiros irmãos creram, viveram e pregaram...

Mas, voltemos ao essencial sobre o qual você me perguntou!

Nós cremos que Deus foi preparando tudo na história do povo judeu... E no tempo que Ele escolheu – Olhe só que coisa! Prepare-se porque é estranho, quase coisa de louco o que vou dizer! -, Ele próprio enviou o Seu Filho, Deus como Ele, igual Ele, para fazer-Se homem, fazer-Se criatura, fazer-Se matéria, fazer-Se mundo, igual à Sua criação, igual à humanidade!

Juliano: Então, os cristãos acreditam que Jesus, o homem como os homens, é Deus igual a Deus?!

Teófilo: Sim! Nós dizemos, desde o princípio da pregação dos Apóstolos: Tudo foi criado através Dele e para Ele, Ele estava com Deus e Ele mesmo era Deus! Dizemos assim: Ele, Jesus, é Deus vindo de Deus, Luz nascida da Luz, Deus verdadeiro gerado sempre, eternamente, de Deus verdadeiro, Filho do mesmíssimo Ser, da mesmíssima Substância do Pai, sendo Ele mesmo Um com o Pai!

Juliano: É meio doido! É meio besta! É meio lenda! É meio estória da carochinha! Um homem ser Deus; Deus ser um homem!

Teófilo: Eu lhe disse! Não é possível ser cristão sem crer que Deus Se revelou, que Ele nos falou! Não é um cálculo, não é uma filosofia, não é uma descoberta humana! O cristianismo nasce da adesão a uma revelação! Mas, eu não quero me deter nisto – teria muitíssimo a falar sobre este tema! Quero lhe dizer o que você me perguntou, quero lhe dizer a essência do cristianismo! Ainda não cheguei lá,

Teófilo: Aqui está o essencial, o caroço, o núcleo do cristianismo: em Jesus de Nazaré Deus mesmo Se fez pessoalmente humano, parte deste mundo. Ele veio nos trazer a Vida de Deus, da qual precisamos para viver a Vida divina já nesta vida e ter a Plenitude da comunhão com Deus no mundo que há de vir.

Juliano: E para vocês, cristãos, como Jesus fez isto? Qual o mecanismo? Como funciona? Como devo compreender que essa Vida divina, essa Energia chega até mim e chega ao universo?

Teófilo: Primeiro é preciso compreender que essa Energia, essa Vida divina, Essa Glória, essa Seiva, esse Poder divino tem um nome: Espírito! E como nós cremos que esse Espírito é Deus, chamamos Espírito “Santo” – só Deus é Santo! A pregação dos Apóstolos, que as Escrituras nos guardaram e transmitem, nos diz isto: o Deus Único – absolutamente UM e Único – , Deus de Israel, o Deus dos judeus, é Pai, Filho e Santo Espírito. Pois bem: cremos que o Filho Jesus Se fez humano, com vida humana igualzinha à nossa, de corpo humano e alma humana, para, como humano, ser cheio do Espírito Santo, da Energia divina e, assim, nos energizar de Deus, nos divinizar, nos dar a semente daquela Plenitude de que lhe falei... É assim que somos salvos, é assim que teremos a Plenitude: recebendo a Vida do próprio Deus! Somos cristãos para receber a Vida, a Energia divina que Jesus nos trouxe!

Juliano: E como Jesus fez para dar a vocês essa Vida, esse Espírito Santo? E como pode dar essa Energia ao universo todo? É meio irreal isso, não é não?

Teófilo: Primeiro, atenção: o Filho eterno fez-Se realmente humano! Como humano, com vida humana, gestos humanos e palavras humanas nos mostrou humanamente Quem é Deus, qual o verdadeiro caminho para Ele, qual o sonho do Altíssimo para a humanidade. Ele fez isto com gestos e com palavras, com todo o Seu modo de viver!

Juliano: Quer dizer, então, que Jesus é um mestre e ser cristão é fazer o que Ele ensinou?

Não, não! Este é o engano de muitíssimos! Se fosse assim, Jesus seria somente um filósofo, um guru, um propagador de ideias, um sábio! Jesus, com a Sua vida e Suas palavras, mostrou-nos o caminho para Deus, o Pai. Cada palavra, cada gesto de Jesus nos revela Deus, nos faz entrar em contato com o Deus verdadeiro, porque Ele mesmo é uma Pessoa divina: não é simples mestre, mensageiro, profeta, sábio, guru rabino... Ele é uma Pessoa divina agindo humanamente, numa natureza humana! Só isto já bastaria para mostrar o quanto Jesus é absolutamente único e insubstituível para nós, cristãos!

Mas, isto é só um aspecto da Sua missão em nosso favor! Tem ainda muito mais!

Primeiro, assumindo tudo quanto é realmente humano, Ele foi mostrando como viver humanamente na vontade do Pai e, assim, sendo Ele mesmo Deus, foi consertando, redimindo o humano que, além de não pleno, fora deturpado, deformado pelo pecado. Jesus é o homem perfeito, o protótipo, o modelo de toda verdadeira humanidade! Quanto mais parecermos com Ele, mais humanos seremos! Quanto mais longe Dele, mais desumanos, deformados somos! É como aquela música: “Eu caçador de mim...” Vivo me procurando... Só me encontrarei de verdade em Jesus, o Homem perfeito, o modelo de toda humanidade!

Mas, isto ainda não é tudo! Este ainda não é o ponto principal! Estamos caminhando para o miolo, o núcleo do cristianismo. Vou lhe dizendo coisas cada vez mais centrais, mais importantes... Mas, ainda não o essencial do ser cristão, pelo qual você, Juliano, me perguntou!

Juliano: Então, vamos lá: segundo vocês, Deus criou tudo perfeito, mas não pleno. Essa Plenitude seria um caminho que o homem e toda a criação teriam de fazer, um dom que Deus daria mais adiante.

Teófilo: Isto mesmo! Basta ver o relato da criação no Gênesis: a plenitude não está no início... Vai aumentando, vai dirigindo-se para um misterioso “descanso” de Deus, do Deus que não Se cansa nunca, como diz o Salmo 120/121! A plenitude de Vida que Deus daria está simbolizada na Árvore da Vida, para a qual Deus fechou o caminho, por causa da presunção o homem de querer ser pleno do seu modo: decidindo por si, de modo soberbo o que é bem e o que é mal! É este o sentido daquele belíssimo conto do Gênesis! O homem vive procurando essa Árvore, esse Fruto, essa vida! Procura no poder, no sexo, nos mil prazeres, nos bens materiais, no sucesso, nas pessoas... E nada, nada de encontrar o caminho para a Árvore, nada de roubar o fruto! Deus fechou o caminho! Comer o Fruto é dom de Deus! Nunca será presunção humana! Lembra? Até em Babel o homem tentou chegar à Vida de Deus com suas próprias forças! Bicho teimoso, o homem! E só construiu “confusão”. É este o sentido de “Babel”, as de ontem e de hoje!

Juliano: Ainda não sei onde esta história via dar... Mas, é inteligente, é interessante! Quando se compreende bem, se vê que toca a essência mesma da história e dos sonhos humanos!

Mas, continuando, para ver se compreendi bem: para levar o homem e toda a criação à Plenitude e para dar-lhes o perdão do pecado da presunção original, Deus enviou Deus: o Pai enviou o Filho para que o Filho “turbinasse”, transfigurasse, plenificasse, tudo com a Vida divina, com a Plenitude! E esta Plenitude é Deus mesmo, chamado Espírito Santo! Isto? Fica engraçado: Deus enviou Deus para nos dar Deus! Ou: o Pai enviou o Filho para dar o Espírito! É isto?


Teófilo: Perfeito! Mas, atento: só há um Deus, não dividido, não multiplicado, Eterno, Infinito, Santo! E no entanto o Pai que envia não é o Filho enviado que, por Sua vez, não é o Espírito derramado em nós!

Juliano: Em todo caso, pelo que compreendi até agora, a finalidade de toda esta história seria, então, dar a Vida, a Plenitude, a Energia de imortalidade, de felicidade, de bênção, de paz... E isto tudo é esse Espírito Santo... Compreendi bem?

Teófilo: Perfeitamente!

Juliano: E por que escuto falar tão pouco desse Espírito Santo? Porque se é como você me diz, Ele é central, absolutamente indispensável, para essa Salvação, essa Plenitude! Por que os cristãos só dizem que Jesus salvou tudo e pronto? Eu nem sabia que era preciso esse Espírito Santo para a Salvação... Ao menos não pensei que fosse indispensável deste modo!

Teófilo: Isto mesmo! Infelizmente, a catequese dos cristãos sobre o Espírito Santo é muitíssimo deficiente! Por isso tantos mal-entendidos sobre o sentido último do cristianismo! Lembro agora de uns primeiros cristãos de Éfeso, que diziam: “Nós nem sabemos que há um Espírito Santo!” Está lá, nos Atos dos Apóstolos!

Mas, ainda não chegamos lá, no centro! É preciso dar ainda alguns passos! Aí chegaremos no “x” da questão!

Juliano: Pois bem! Qual o próximo passo para chegarmos ao essencial do cristianismo?

Teófilo: Lá vai: Jesus, Deus-Filho feito homem deveria encher-Se de Vida divina, de Energia divina, de Espírito Divino, na Sua natureza humana, composta, como a nossa, de corpo e alma humana, para nos “contagiar” com esse Espírito, dando-nos, assim, a Vida de Deus.

Juliano: Agora complicou muito! Como assim “contagiar?

Teófilo: Pense num vírus. Por exemplo: o vírus da aids. No início estava somente nos macacos; não contagiava humanos. Quando um humano foi contagiado, passou para outros humanos: de humano para humano. Assim também a tal da gripe suína. Pois bem: Jesus é Deus que Se fez homem; assumiu a vida humana e, humanamente, nos mostrou Deus: em Suas palavras, em seus gestos, na Sua vida entre nós, Deus Se revelou humanamente e nossos olhos viram a Deus humanizado, nossas mãos tocaram Deus na Sua humanidade! Mas, a natureza humana de Jesus era igual à nossa; não tinha vida divina: era frágil, precisava de alimento e descanso, de tudo quanto a nossa precisa... Era mortal! Que pobreza, que humildade ,que humilhação: Deus humanizado, Deus fragilizado, Deus igual aos homens em tudo! Deus feito mundo, feito matéria limitada! Assim, feito pobre, feito homem, feito incapaz de, sozinho, ter a Plenitude na Sua humanidade, Jesus, para nos contagiar com a Vida divina, deveria primeiro recebê-La em plenitude em Si mesmo! Em outras palavras: a natureza humana de Jesus precisava ser divinizada para poder nos dar Vida divina!

Juliano: Nunca ouvi falar dessas coisas!

Teófilo: Imagino! No entanto, estamos chegando no núcleo mesmo, na essência mais verdadeira do cristianismo! Está tudo lá, nas Escrituras, nas Epístolas dos Apóstolos!

Juliano: Então, explique: Como Jesus encheu a natureza humana Dele de Vida Divina, de Espírito Santo?

Teófilo: Esvaziando-Se da Sua vida meramente biológica e psíquica! Na cruz, num ato de amor obediente, o Homem Jesus desfez o nó da desobediência humana, desmantelou o mecanismo que nos mantinha longe de Deus. Mas, isto ainda não é tudo nem o principal.

O principal é isto: Ele, na cruz, esvaziou-Se totalmente de Si, da Sua vida humana e, assim, o Pai encheu de Espírito Santo o Seu corpo humano e a Sua alma humana! Jesus, na Sua humanidade que era igual à nossa, foi totalmente divinizado pelo Espírito Santo no momento da Ressurreição!

Juliano: Explique isso melhor!

Teófilo: Foi o Pai Quem ressuscitou o Filho. Fez isso impregnando-O, no Seu corpo e na Sua alma, com o Espírito Santo. Compreende: Jesus foi ressuscitado pelo Pai com a Potência, a Vida, a Plenitude do Espírito! Como o fogo impregna e transfigura uma barra de ferro, a humanidade de Jesus foi transfigurada pelo Espírito Divino! Assim, Jesus ressuscitado é um novo tipo de homem, é um Novo Adão, é o Primogênito de uma raça nova, que não tem só uma vida biológica ou psíquica; tem agora uma Vida “Espirituada”, uma Vida plena de Espírito Santo!

Juliano: E esta Vida é diferente da nossa e das outras criaturas?

Teófilo: Totalmente! É Vida do próprio Deus, Vida do Eterno, Vida “Eterna” e não mais simplesmente “humana”! Essa Vida, nós sequer podemos imaginar direito como será! Nós cremos que é algo como os olhos jamais viram, os ouvidos jamais ouviram e nem mesmo o coração humano imaginou! Cremos que gloriosa da Glória de Deus, incorruptível da Incorruptibilidade de Deus, “espirituada” do Espírito de Deus! Essa Vida não mais pertence nem está sujeita às leis deste mundo nosso! Basta ver o corpo de Jesus ressuscitado!

Juliano: Não sei bem, não entendo muito de Bíblia... Como era o corpo de Jesus quando Ele ressuscitou?

Teófilo: Aí é que está: as Escrituras, os Evangelhos não conseguem nem pretendem descrevê-lo! Está em outra! É totalmente diverso! É o mesmo corpo Seu, tem as chagas da paixão, mas de um modo totalmente diverso! Os discípulos não podiam nem vê-Lo nem reconhecê-Lo mais, a não ser que Ele se mostrasse e Se fizesse reconhecer! Jesus agora tinha um corpo divinizado! Os Doze só podiam exclamar, admirados: “Senhor!”

Atenção: “Senhor”, aqui não é uma simples título de respeito, mas é o Nome do próprio Deus: “Adonai”, em hebraico, dito “Kyrios”, “Senhor”, em grego...

Compreende, Juliano? A certeza de que Jesus é Deus não nasceu de uma teoria, mas de um susto, de uma baita e inacreditável experiência, que deixou os Doze primeiros discípulos tontos para sempre: Jesus estava agora com um corpo totalmente divinizado, um corpo que não mais estava sujeito a este mundo, um corpo totalmente impregnado do Espírito de Deus, da Energia divina! Ali era Vida pura, borbulhando, expandindo-Se... Não dá para imaginar, para descrever, para narrar... Foi um choque! Mas, isto transformou para sempre a vida daqueles lá! Tanto que, a partir daí, somente viveram e morreram por Jesus e para Jesus!

Juliano: É uma história incrível! É bonita e surpreendente... Se é verdade, ainda não sei direito! Mas, e a tal da Plenitude, da Vida, do Espírito? Jesus agora está cheio de tudo isto, é o Novo Adão... E os cristãos, como recebem esta Vida, como Jesus os contagia?

Teófilo: Então! O Filho fez-Se homem e esvaziou-Se de Sua vida humana até a morte para que o Pai O enchesse, na Sua humanidade igual à nossa, com a Potência vivificante, que é o Espírito Santo. E para que isto? Para nos contagiar, para nos dar Sua Vida divina! Por isso Ele dizia, na Última Ceia: “É do vosso interesse que Eu parta; se Eu não partir, isto é, se Eu não Me esvaziar de Minha vida simplesmente psicofísica, o Espírito não poderá vir a vós. Mas, se Eu Me for, se Eu me esvaziar totalmente de Mim até a morte de cruz, o Pai, que é fidelíssimo, Me glorificará, encherá Minha pobre natureza humana, igual à vossa, de Espírito Santo, isto é, de Vida Divina, de Glória Divina, de Potência Divina e divinizante! E Eu poderei dar-vos esse Espírito que, então, será humanamente Meu!”

Juliano: Que coisa! Nunca tinha escutado assim a fé cristã!

Teófilo: Veja: o humano (Jesus na Sua humanidade agora divinizada pelo Espírito) salva o humano, a carne salva a carne! Desse modo, na tarde mesma da Ressurreição, Jesus, totalmente divinizado no Seu corpo e na Sua alma, soprou sobre os Apóstolos! Soprou-lhes o Espírito, soprou como Deus soprou no princípio, quando criou o céu e a terra, soprou sobre eles, que representavam a Igreja toda, a multidão toda dos que acreditariam, recriando-os!

Juliano: Como assim?

Teófilo: Naquele momento, os discípulos tornaram-se cristãos!

Juliano: E os Doze já não eram cristãos antes?

Teófilo: Não! O cristianismo nasce com a efusão do Espírito do Ressuscitado! Antes os Doze eram discípulos: amavam Jesus, seguiam Jesus, acreditavam Nele... Mas, ainda não tinham dentro de si a Vida divina Dele. Essa Vida é o Espírito Santo, agora Espírito de Jesus, dado pelo Pai, que eles receberam naquele Sopro bendito na tarde da Ressurreição, no Cenáculo! Naquele momento, os Doze foram batizados no Espírito.

Agora, com o Espírito de Cristo, eles tinham neles a Vida de Cristo ressuscitado, como os galhos têm a seiva do tronco da videira, como os membros têm a vida da cabeça do corpo! A partir daquele momento, os Doze tinham neles a semente de Deus, o germe divino, o princípio de imortalidade, que vence a própria morte psicofísica!

Juliano: É impressionante, esta história toda! Mas, e a Igreja, e os outros cristãos? Jesus deu o Espírito de Vida aos Apóstolos, vivificando-os. E a humanidade toda? E a criação toda? E quem estava fora do Cenáculo?

Teófilo: Certamente não! Preste bem atenção, Juliano, porque aqui, começamos realmente a entrar no núcleo mais central do cristianismo: Aquele Seu Espírito Vivificante, que Cristo ressuscitado deu aos Apóstolos na tarde da Ressurreição, aquela Vida divina, Vida de plenitude, Ele deu, dá e continuará dando aos Seus discípulos até o final dos tempos!

Juliano: Teimo com a minha pergunta: Como o Cristo ressuscitado faz isso? Como Ele dá o Espírito aos Seus discípulos para inundá-los com essa Vida divina? Como Cristo continua alcançando todos os homens, em todos os tempos e lugares? Como Ele faz essa “transfusão” de Espírito Santo Dele para nós?

Teófilo: Aqui chegamos ao “x” da questão: O Senhor continua dando a Sua Vida divina que vivifica, que plenifica tudo, cristifica tudo e tudo prepara para a Vida eterna através dos sacramentos da Igreja; sacramentos que Ele mesmo instituiu!

Você sabe – e eu já disse antes – que Jesus veio realizar Sua missão não somente por Sua pregação, mas também por Seus gestos salvíficos, culminando com Sua morte e ressurreição. Pois bem, esses gestos de Jesus - agora que Ele ressuscitou e está cheio de Espírito vivificante – continuam nos sacramentos e, através deles, o Espírito é dado aos fieis.

Assim, cada vez que um cristão recebe os sacramentos, recebe uma dose de Espírito Santo, uma dose de Vida de Cristo ressuscitado, uma dose de Vida eterna... E mais: pela Igreja que celebra os sacramentos, os mistérios divinos (é assim que os cristãos chamam as celebrações dos sacramentos: mistérios divinos), o mundo todo vai sendo cristificado, divinizado, transfigurado! São Paulo mostra isto bem direitinho no capítulo VIII da Epístola aos Romanos: o destino do cosmo está misteriosamente unido ao destino da humanidade, e o destino da humanidade realiza-se nos cristãos, humanidade transfigurada em Cristo! Que coisa! Pense bem: nos sacramentos a Salvação acontece, nos sacramentos o homem é plenificado, nos sacramentos a Vida eterna entra no nosso mundo caduco e precário, nos sacramentos a criação toda planta em si os germens da Vida Gloriosa que explodirá no Final dos Tempos! Nos sacramentos, o que a Palavra anuncia na força do Espírito, na força do Espírito acontece efetivamente!

Juliano: Então, você está me dizendo que os sacramentos são essenciais para receber aquela Plenitude para a qual, segundo você, Deus criou tudo?

Teófilo: Perfeitamente! Lembre: o Espírito Santo de Cristo é a própria Graça divina, é a Glória divina, é a Plenitude divina, é a Vida divina, é o Poder divino! É recebendo esse Espírito de Cristo que somos unidos realmente, concretamente, verdadeiramente a Cristo Jesus e, por Ele, temos acesso a Deus, o Pai! Era isto que Jesus queria dizer quando falava nós permaneceríamos Nele e Ele em nós! Isto é real, isto é um mistério incrível! Nós Nele como os membros no corpo, como os ramos na videira... E a Vida que liga os membros no corpo e os ramos na videira é o Espírito recebido nos sacramentos!

Sem os sacramentos o cristianismo seria palavra anunciada mas não realizada, promessa sem cumprimento! Dito de outro modo, mais uma vez: o que a Palavra anuncia, os gestos sacramentos realizam! Segundo a fé dos cristãos, quem age nos sacramentos é o próprio Cristo Senhor ressuscitado, cheio de Espírito Santo! Os sacramentos são, antes de tudo, ações de Cristo, gestos de Cristo! Por isso não podem ser suprimidos, aumentados, manipulados! Ali é Cristo Quem age e nos dá o que nós mesmos não poderemos jamais produzir: a Vida Plena, a Vida Eterna, a Vida Divina! Os cristãos não produzem a Vida, a Igreja, coitadinha, não produz a Graça, padre ou Bispo algum gera a salvação! É Cristo na potência do Espírito! Só Ele é o Salvador, só Ele é o Autor da Graça! E tudo isto Ele opera nos sacramentos, ou melhor, no Espírito dado nos sacramentos! Compreendeu?

Esta é a essência do cristianismo: somos cristãos porque cremos que Jesus é o Filho do Pai, Filho cheio de Espírito Santo, que Ele nos dá através dos sacramentos! Somos cristãos para sermos plenificados, transfigurados, santificados, divinizados! Divinizados porque, sendo humanos por natureza, pela Graça – que é o Espírito Santo – somos tornados participantes da natureza divina, a ponto de sermos verdadeiramente filhos de Deus porque recebemos em nós nos sacramentos o Espírito do Filho que clama em nós “Abbá-Pai”! Somos cristãos porque não nos contentamos só com esta vida precária e mortal, somos cristãos porque cremos e queremos e esperamos a Vida plena que só Jesus nos dá! Compreendeu?

Juliano: Tenho ainda uma dúvida. Se os sacramentos dão o Espírito de Cristo que é a Plenitude, a Vida, a Eternidade, por que, então, são sete sacramentos?

Eu não sabia que todos os sacramentos dão o Espírito Santo! E, se os sete dão, então não bastaria receber um só, e já se teria o Espírito Santo? Para que receber sete vezes o Espírito Santo?

E olhe que são mais de sete, porque se celebra a Eucaristia muitas vezes, se deve confessar muitas vezes, se pode casar mais de uma vez, já vi gente recebendo a Unção dos Enfermos mais de uma vez! Isto não parece se encaixar no que você acabou de dizer...

Teófilo: Veja: em cada sacramento recebemos o Espírito Divino; sempre o mesmo Espírito, mas em cada um deles o efeito que o Espírito provoca é diferente! É o mesmo Espírito que tem sete formas – Espírito septiforme: as formas dos sacramentos! Na nossa fé cristã o Espírito é assim: unidade e diversidade, sempre o mesmo provocando efeitos bem diversos! Penso que Jesus instituiu os sete porque “sete” significa plenitude; e os sacramentos permeiam plenamente toda a vida do cristão, levando-o a ser humanidade plena, totalmente cheia da Vida divina!

Juliano: Compreendi sim! Mas, só para não ficar meio no ar... Que efeitos essa Energia de Cristo ressuscitado, que é o Espírito Santo, provoca em quem recebe os sacramentos?

Teófilo: De modo bem resumido:

No Batismo, o Espírito é dado na água como Vida nova, Vida ressuscitada, Vida eterna em Cristo; 

Na Crisma (atenção: “a Crisma” é o sacramento; “o crisma” é o óleo usado no sacramento), o Espírito é dado como Força para edificar a Igreja e testemunhar a fé; 

Na Eucaristia, o Espírito transfigura e impregna o pão e o vinho, tornando-os Corpo e Sangue do Cristo imolado e ressuscitado. Assim, quem comunga, recebe, no Cristo e com o Cristo, o Espírito de imolação, de oblação amorosa; o mesmo Espírito no qual o Filho Se entregou ao Pai na Sua vida humana até a morte de cruz!

Na Penitência, se recebe o Espírito para a remissão dos pecados;

No Matrimônio, o casal recebe o Espírito de Amor Esponsal, o mesmo com o qual Cristo e a Igreja se amam, de modo que o Espírito, consagrando o amor dos dois, o faz sacramento do amor entre Cristo e a Igreja.

Na Ordem, o Espírito unge o eleito para que ele possa agir em Nome e na Pessoa de Cristo sacerdote, mestre e pastor real do rebanho. É exatamente na força do Espírito que os ministros ordenados podem agir em Nome de Cristo.

Por fim, na Unção dos Enfermos, o Espírito é dado como Força, Sustento e Consolo para que o cristão, unido ao Senhor, possa completar na sua carne os padecimentos de Cristo, possa também ter o perdão de seus pecados, alívio de suas dores e sofrer de modo cristão, participando da paixão do Senhor!

Como você pode ver, o Espírito dado e recebido nos sacramentos impregna a vida do cristão de Vida Eterna, Vida de Deus!

O cristão já entrou na Plenitude, já vive na Plenitude. Mas, essa Vida nova e plena só será manifestada na Glória do Céu! Tanto São Paulo quanto São João dizem isto nas suas epístolas! Os primeiros autores cristãos gostavam de dizer que os cristãos são uma raça diferente porque têm uma Vida diferente, um germe da Eternidade, de um outro Mundo, do Mundo de Deus! Essa Vida nova, essa Salvação, essa Santidade, essa Glória é real e concreta, como são concretos os sacramentos! No entanto, “já somos filhos de Deus, mas o que seremos ainda não se manifestou. Quando Cristo nossa Vida aparecer, seremos semelhantes a Ele, pois o veremos como Ele é!”

Juliano: Teófilo, não posso dizer que creio! Mas, posso dizer que o cristianismo tem sentido e é uma bela crença, uma estupenda eperança. Compreendi seu miolo, sua essência, sua ideia central!

Teófilo: Tudo o mais na doutrina cristã decorre disso que acabei de apresentar-lhe. Tudo se encaixa nisso e leva a isso. Tudo o mais!

Gastei um monte de palavras para explicar nossa fé. Agora, o resto é com você e com a Graça do Senhor! O Espírito levou você a sentir a curiosidade, levou-o a perguntar, a procurar entender! É o Espírito Quem haverá de suscitar em você a resposta generosa que se resume em duas palavras: “Eu creio!” Mas isto fica no sacrário do mistério do encontro da sua liberdade com a liberdade gratuita de Deus!

Juliano: Eu agradeço o tempo que você perdeu comigo! Agradeço por me ter mostrado sua fé de modo tão harmonioso e coerente! Você que crê, reze por mim!

Teófilo: Rezarei! Você não está longe do Reino dos Céus! Que o Senhor complete a obra que iniciou em você e lhe conceda tanta sede Dele que não tenha paz até que O encontre plenamente neste mundo e no outro!

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